O viés trapaceiro da cognição
Porque pensar é trabalhoso.
Buster
Benson
Eu
sempre consulto a
lista de tendências cognitivas da Wikipedia
toda vez que
tenho um palpite de que um certo tipo de pensamento é considerado de
viés oficial, mas não consigo me lembrar do nome ou dos detalhes.
Tem sido uma referência inestimável para me ajudar a identificar as
falhas ocultas em meu próprio pensamento. Não encontrei ainda nada
melhor que seja, ao mesmo tempo, tão abrangente e sucinto.
No entanto, honestamente, a página da
Wikipedia é um pouco confusa. Apesar de tentar absorver as
informações dessas páginas muitas vezes ao longo dos anos, bem
pouco parece permanecer. Frequentemente faço uma varredura e sinto
que não consigo encontrar exatamente aquilo que procuro, e logo
esqueço o que aprendi. Acho que isso tem a ver com a forma como tais
páginas evoluíram organicamente ao longo dos anos. Hoje, ela agrupa
175 vieses (ou tendências) em categorias vagas (tendências de
tomada de decisão, vieses sociais, erros de memória, etc.), que
realmente não me parecem mutuamente exclusivos, e os relaciona
alfabeticamente em categorias. Há duplicidades em abundância, e
muitas informações semelhantes com nomes diferentes, espalhadas a
esmo.
Passei algum tempo nas últimas quatro
semanas (estou de licença-paternidade) para tentar absorver e
compreender mais profundamente essa lista, e tentar encontrar uma
estrutura de organização mais simples e clara para escapar das
informações inúteis. Ler mais atentamente as várias tendências
de informações disponibilizadas deu ao meu cérebro algo para
ruminar enquanto colocava o pequeno Louie para dormir.
Comecei com a lista bruta das 175
tendências e adicionei todas à uma planilha, depois fiz outro exame
removendo duplicidades e agrupando vieses semelhantes (como efeito
bizarro e efeito de humor) ou vieses complementares (como viés de
otimismo e viés de pessimismo). A lista chegou à cerca de 20
estratégias mentais tendenciosas que usamos por razões muito
específicas.
Fiz várias tentativas diferentes para
tentar agrupar essas 20 em um nível mais alto e, eventualmente,
consegui agrupá-las pelo problema mental geral que elas estavam
tentando resolver. Todo viés cognitivo existe por uma razão -
primeiramente para economizar tempo ou energia aos nossos cérebros.
Se você olhar para eles pelo problema que estão tentando resolver,
torna-se muito mais fácil entender por que existem, como são úteis
e os intercâmbios (e erros mentais resultantes) que introduzem.
Quatro problemas que as tendências nos ajudam a abordar:
Sobrecarga de informação, falta de significado, necessidade de agir com rapidez e como saber o que precisa ser lembrado posteriormente.
Problema 1: Muita informação.
Há
um excesso de informação no mundo, não temos escolha senão
filtrar quase toda ela. Nosso cérebro usa alguns truques simples
para escolher os pedaços de informação que provavelmente serão
úteis de alguma forma.
-
Bizarros / engraçados / visualmente impressionantes / coisas antropomórficas se destacam mais do que coisas não-bizarras / sem graça. Nossos cérebros tendem a aumentar a importância de coisas que são incomuns ou surpreendentes.
-
Notamos as falhas dos outros mais facilmente do que as nossas próprias. Sim, antes de ver esse artigo como uma lista de peculiaridades que comprometem a maneira como as outras pessoas pensam, perceba que você também está sujeito a elas
. Ver: Ponto cego, Cinismo ingênuo, Realismo ingênuo
Problema 2: Significado insuficiente.
O
mundo é muito confuso, e acabamos enxergando apenas uma pequena
parte dele, mas precisamos dar-lhe algum sentido para sobrevivermos.
Uma vez que recebemos um fluxo reduzido de informações, conectamos
os pontos, preenchemos as lacunas com coisas que achamos que sabemos, e atualizamos nossos modelos mentais do mundo.
-
Nós preenchemos características oriundas de estereótipos, generalidades e histórias anteriores sempre que há novas instâncias específicas ou lacunas na informação. Quando temos informações parciais sobre uma coisa específica que pertence a um grupo de coisas com as quais estamos bastante familiarizados, nosso cérebro não tem problema em preencher as lacunas com as melhores estimativas ou o que outras fontes confiáveis fornecem.
-
Simplificamos probabilidades e números para torná-los mais fáceis de pensar. Nossa mente subconsciente é péssima em matemática e, geralmente, se algum dado estiver faltando, erra sobre a probabilidade de algo acontecer. Ver: Contabilidade mental, Viés de normalidade, Apelo à probabilidade falaciosa, lei de Murphy, Efeito Sub-atividade, Efeito sobrevivência, Viés soma zero, Efeito de Denominação, Número Mágico 7 + -2
-
Pensamos saber o que os outros estão pensando. Em alguns casos, isso significa que assumimos que eles sabem o que sabemos, em outros casos, assumimos que estão pensando em nós tanto quanto estamos pensando em nós mesmos. É, basicamente, apenas um caso onde modelamos a mente alheia depois da nossa própria (ou, em alguns casos, depois de uma mente muito menos complicada do que a nossa).
Ver: Maldição do conhecimento, Ilusão de transparência, Efeito Spotlight, Ilusão de agência externa, Ilusão de insight assimétrico, Erro de incentivo extrínseco -
Projetamos nosso atual estado mental e presumimos sobre o passado e o futuro. Ampliado também pelo fato de não sermos muito bons em imaginar quão rapidamente ou lentamente as coisas vão acontecer ou mudar com o tempo. Ver: Viés retrospectiva, Viés de resultado, Sorte moral, Declínio, Efeito telescópico, Retrospecção rosada, Preconceito de impacto, Viés do pessimismo, Falácia do planejamento, Viés de economia de tempo, Viés Pró-inovação, Viés de projeção, Viés de restrição, Viés de auto-consistência
Problema 3: Necessidade de agir rápido.
Estamos
pressionados pelo tempo e pela informação e, mesmo assim, não
podemos deixar que isso nos paralise. Sem a capacidade de agir
rapidamente ante o desconhecido, certamente teríamos morrido como
espécie há muito tempo. Com cada pedaço de nova informação,
precisamos fazer o melhor possível para estimar nossa capacidade de
afetar a situação, aplicá-la à decisões, simular o futuro para
prever o que pode acontecer a seguir e agir de acordo com nosso atual
discernimento.
-
Para agir precisamos ter confiança em nossa capacidade de causar impacto, e sentir que o que fazemos é importante. Na realidade, a maior parte dessa confiança pode ser classificada como excesso de confiança, mas sem ela podemos não agir.
Ver: Efeito excesso de confiança, Viés egocêntrico, Viés otimismo, Desvio social desejável, Efeito de terceira pessoa, Efeito anterior, Efeito Barnum, Ilusão de controle, Efeito de consenso falso, Efeito Dunning-Kruger, Efeito fácil, Superioridade ilusória, Efeito Lago Wobegone, Viés de autoserviço, Viés de observador de ator, Erro de atribuição fundamental, Hipótese de atribuição defensiva, Tendência de atribuição de traço, Justificativa do esforço, Compensação de risco, Efeito Peltzman -
Para nos mantermos focados, favorecemos a coisa imediata e identificável à nossa frente, em detrimento do que está distante e mais demorado. Valorizamos mais as coisas no presente do que no futuro, e nos relacionamos mais com histórias de indivíduos específicos do que a de indivíduos ou grupos anônimos. Surpreende-me não ter encontrado mais tendências em relação a este último, considerando o quanto isso impacta a forma como pensamos sobre o mundo.
Ver: Desconto hiperbólico, Apelo à novidade, Efeito de vítima identificável -
Sob todos os aspectos, estamos sempre mais motivados para concluir aquilo no qual já investimos tempo e energia. A versão da primeira lei do movimento de Newton, em termos de Economia: um objeto em movimento permanece em movimento. Isso nos ajuda a terminar as coisas, mesmo que nos deparemos com mais e mais motivos para desistir. Ver: Falácia do custo afundado, Escalonamentoirracional, Escalada de compromisso, Aversão à perda, Efeito IKEA, Efeito de dificuldade de processamento, Efeito de geração, Viés de risco zero, Efeito de disposição, Viés da unidade, Efeito de pseudo certeza, Efeito da doação, Efeito Backfire
-
Para evitar erros, estamos motivados a preservar nossa autonomia e status em um grupo e a evitar decisões irreversíveis. Se tivermos que escolher, tendemos pela opção que é percebida como a menos arriscada, ou que preserva o status quo. Melhor o diabo que você conhece do que aquele que você não conhece.
Ver: Justificação do sistema, Reatância, Psicologia reversa, Efeito de chamariz, Viés de comparação social, Viés de status quo -
Em detrimento de opções mais complexas e ambíguas, damos preferência às que pareçam simples ou que tenham informações mais completas. Preferimos fazer a coisa rápida e simples do que a coisa complicada e importante, mesmo que essa última seja, em última análise, uma melhor utilização do tempo e da
energia. Ver: Viés de ambiguidade, Viés de informação, Viés de crença, Rima como efeito de razão, Efeito de derramamento de bicicleta, Lei da trivialidade, Efeito Delmore, Falácia da conjunção, Navalha de Occam, Efeito Menos-é-melhor.
Problema 4: O que devemos lembrar?
Há
demasiada informação no universo. Só podemos nos dar ao luxo de
manter contato com os dados que provavelmente serão úteis no
futuro. Precisamos nos arriscar em negociações entre o que devemos
lembrar e o que podemos esquecer. Por exemplo, preferimos
generalizações sobre especificidades porque elas ocupam menos
espaço. Quando há muitos detalhes importantes, selecionamos alguns
itens de destaque para salvar, descartando o resto. Salvamos o que
tem maior probabilidade de prevenir nossos filtros contra a
sobrecarga de informações do problema 1, bem como informar o que
vem à mente durante os processos mencionados no problema 2 do
preenchimento de informações incompletas. Tudo é auto-reforçador.
-
Nós editamos e reforçamos algumas memórias após o fato. Durante esse processo, as memórias podem se tornar mais fortes, no entanto, vários detalhes também podem ser acidentalmente alterados. Às vezes, acidentalmente injetamos um detalhe na memória que não estava lá antes. Ver: Atribuição incorreta de memória, confusão na origem, Criptomnésia, Memória falsa, Sugestionabilidade, Efeito de espaçamento
-
Para formar as generalidades descartamos os detalhes. Fazemos isso por necessidade, mas o impacto das associações implícitas, estereótipos e preconceitos resulta em algumas das mais gritantes más consequências do nosso conjunto completo de propensões cognitivas.
Ver: Associações implícitas, os estereótipos implícitos, viés estereotipado, Preconceito, Viés de negatividade, Viés de fading -
Reduzimos eventos e listas aos seus elementos-chave. É difícil reduzir eventos e listas para generalidades, então, em vez disso, selecionamos alguns itens para representar o todo.
Ver: Regra de pico final, Nivelamento e nitidez, Efeito de desinformação, Negligência de duração, Efeito de recordação serial, Efeito de comprimento de lista, Efeito de modalidade, Inibição de memória, Efeito de indicação de lista de peças, Efeito de primazia, Efeito de recência, Efeito da posição serial, Efeito sufixo -
Armazenamos memórias de maneira diferente com base em como elas foram experimentadas. Nosso cérebro codificará apenas informações que considere importantes no momento, mas essa decisão pode ser afetada por outras circunstâncias (o que mais está acontecendo, como as informações são apresentadas, podemos encontrar facilmente as informações novamente se precisarmos, etc.) que têm pouco a ver com o valor da informação.Ver: Níveis de efeito de processamento, Efeito de teste, Distração, Efeito Próximo-da-lista, Dica do fenômeno da língua, Efeito do Google.
Ótimo, e como eu deveria lembrar de tudo isso?
Você
não precisa. Mas você pode começar lembrando esses quatro
problemas gigantescos com os quais nossos cérebros evoluíram para
lidar nos últimos milhões de anos (e talvez adicionar esta página
aos favoritos se você quiser fazer referência ocasional ao viés
exato que está procurando):
A
fim de evitar o afogamento na sobrecarga
de informação,
nossos cérebros precisam revolver e filtrar quantidades insanas de
dados e rapidamente, decidir quais são as poucas
desse oceano que são realmente importantes e devem ser fisgadas.
A fim de agir rápido, em
questões de segundos, nossos cérebros precisam tomar decisões que
possam impactar nossas chances de sobrevivência, segurança ou
sucesso, e nos tornar confiantes de que podemos fazer as coisas
acontecerem.
E
para continuar fazendo tudo isso da maneira mais eficiente possível,
nossos cérebros precisam lembrar-se
dos dados mais importantes e úteis de
novas informações e informar aos outros sistemas para que possam se
adaptar e melhorar ao longo do tempo, mas não mais do que isso.
Isso parece muito útil! Então, qual é o lado negativo?
Além
dos quatro problemas, seria útil lembrar de quatro verdades sobre
como nossas soluções para eles têm suas próprias deficiências:
Estando
consciente dos quatro problemas e das quatro consequências da
estratégia do nosso cérebro para resolvê-los, a
disponibilidade
heurística
(e,
especificamente, o Fenômeno
Baader-Meinhof)
irá garantir que percebamos nossos próprios preconceitos com mais
frequência. Se você visitar esta página para refrescar sua mente
de vez em quando, o efeito
de espaçamento
ajudará a
sublinhar alguns desses padrões de pensamento, e assim, o nosso viés
cego
e
realismo
ingênuo
serão
mantido sob controle.
Nada
do que fazemos poderá afastar os 4 problemas (pelo menos até que
tenhamos uma maneira de expandir o poder computacional e o
armazenamento de memória de nossas mentes para abranger o universo),
mas se aceitarmos que somos permanentemente tendenciosos, e que há
espaço para melhorias, o
viés de confirmação
continuará
a nos ajudar a encontrar evidências que apoiem isso, o que acabará
nos levando a entender melhor a nós mesmos.
"Desde que aprendi sobre o viés de confirmação, consigo encontrá-lo em todo lugar!"
Vieses
cognitivos são apenas ferramentas, úteis nos contextos certos,
prejudiciais em outros. Eles são as únicas ferramentas que temos, e
até são muito bons no que devem fazer. Devemos nos familiarizar com
eles e até mesmo apreciar que, pelo menos, tenhamos alguma
capacidade de processar o universo com nossos cérebros misteriosos.
Atualizando:
Alguns dias depois
de postar isso, John Manoogian III
perguntou
se seria correto fazer uma "re-postagem em diagrama", para
o qual eu naturalmente respondi SIM.
Aqui está o que ele inventou:
O Cérebro - é imenso - maior que oPara que - você -
Universo
coloque-os lado a lado,
E - Com facilidade -
Um o outro irá envolver -
https://betterhumans.coach.me/cognitive-bias-cheat-sheet-55a472476b18
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