segunda-feira, 2 de abril de 2018

Detalhes sobre as traduções da Bíblia

Embora a Bíblia não seja tão popular hoje em dia como há alguns séculos atrás, ainda é um dos livros mais lidos (se não o mais lido) do mundo. E na Holanda, também é assim.
Em janeiro, Dirk Jan de Kooter defendeu sua tese de doutorado sobre a origem da versão mais popular em holandês - e uma das mais antigas - do Livro Sagrado. Neste post faço uma análise sobre a tese defendida.

O “Statenvertaling” holandês (a tradução "estatal" oficial)

Assim como o Reino Unido tem sua versão King James da Bíblia, os holandeses têm uma tradução da Bíblia que também foi iniciada pelo governo. Em 1618, o governo holandês ordenou a tradução da Bíblia para o holandês.

Até então, as pessoas tinham que fazer uso de diferentes versões da Bíblia, como a tradução de Martinho Lutero, ou antigas traduções que, de fato, não se baseavam nas fontes originais, mas em outras traduções. A fim de prover uma tradução ao povo das Terras Baixas, o Dutch Staten-Generaal (Estado-Geral holandês) decidiu que os tradutores encarregados da tarefa trabalhariam diretamente com os textos originais em hebraico, aramaico e grego.

Esses tradutores pagos pela Staten-Generaal completaram seu trabalho entre 1626 e 1635. Em 1637, a tradução foi autorizada pelo governo, após cerca de meio milhão de Bíblias terem sido publicadas. 
Segundo algumas pessoas, tal Statenvertaling ("tradução oficial do Estado", uma chancela no trabalho da tradução ordenada) já havia sido publicada em idioma incomum; o holandês arcaico. No entanto, tornou-se a mais importante e autorizada tradução da Bíblia na Holanda, e manteve essa posição ao longo dos séculos. 
Hoje em dia, a Statenvertaling ainda é vista por alguns grupos religiosos como a melhor e mais confiável tradução da Bíblia, mas sua autoridade perdeu força e muitas outras igrejas e determinados grupos religiosos estão aderindo a novas traduções, ou até mesmo trabalhando em novas traduções.

No entanto, a Statenvertaling conserva alguma autoridade dentro das comunidades cristãs e também em comunidades científicas. Os linguistas, por exemplo, ainda estão pesquisando a amplitude e a profundidade da linguagem usada, ao passo que, mesmo depois de quase quatro séculos, vários provérbios e ditados da vida cotidiana ainda podem ser rastreados até um versículo bíblico em particular.



Mergulhando nas origens da Statenvertaling

Pode não ser uma surpresa que, ao longo dos séculos, muita pesquisa tenha sido realizada sobre alguns aspectos da Statenvertaling. As pessoas continuam estudando aspectos teológicos e linguísticos. No entanto, havia muito o que esclarecer sobre o processo de tradução da Bíblia ocorrido no século XVII. 
Apesar dos pedidos de esclarecimentos de cientistas do país, no início do século 20 sobre a realização da tradução, os holandeses tiveram que esperar até janeiro deste ano para finalmente conhecerem como a Statenvertaling "nasceu". 
Dirk Jan de Kooter pode, então, defender com sucesso sua abrangente tese na qual aborda o processo de tradução seguido pelos tradutores do livro mais lido na Holanda.
Para descobrir como a chamada "tradução oficial" realmente foi feita, De Kooter introduziu um modelo para análise de diferentes traduções da Bíblia. Com base nos textos originais, reconstruiu o processo de tradução do Novo Testamento. 

A análise dos textos deixou claro que um primeiro teólogo entregava uma tradução inicial, que depois era verificada e editada por um outro. Posteriormente, um terceiro colega cuidava da correção linguística do texto. 
Quando a tradução era aprovada, uma equipe de pessoas envolvidas cuidava de fornecer explicações de textos difíceis e ambíguos, as famosas "Kanttekeningen" ("anotações"), que ainda são usadas hoje em dia. 
Finalmente, uma equipe de consultores comentava, e por fim a tradução era finalizada.



Em sua tese abrangente, De Kooter oferece uma análise detalhada dos textos bíblicos para esclarecer como a tradução da Bíblia foi feita, e dos métodos e razões que levaram os tradutores a escolherem certas palavras ou sentenças específicas. Ele é capaz de mostrar que determinados tradutores usaram de fraseados bem particulares, o que influenciou as traduções. 
Também investiga profundamente as diferenças entre antigas traduções da Bíblia e a Statenvertaling, comparando suas peculiaridades linguísticas e as possíveis justificativas para determinadas escolhas de tradução.

O resultado é de quase 400 páginas (A4!) de uma tese que lança luz nova e sem precedentes sobre como o tempo, o arsenal linguístico disponível e as preferências pessoais influenciaram a formação do livro mais lido do país. 

Enquanto algumas pessoas se gabam da fidedignidade da tradução da Bíblia, De Kooter deixa claro que, nessa tradução, muitos outros fatores além da simples orientação divina desempenharam seu papel. 
Ele também conclui que aspectos linguísticos e teológicos influenciaram-se mutuamente. 

A pesquisa de De Kooters é muito interessante, e uma ótima contribuição à literatura existente sobre o Livro Sagrado e suas influências linguística e social. 
A tese está disponível apenas em holandês, mas merece uma tradução para o inglês, abrindo portas para acadêmicos de todo o mundo usarem a metodologia de De Kooter para revelar a história das traduções globais da Bíblia. 

Leitura recomendada!




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