Escolhas: Parte 1 (xkcd) |
Por que não conseguimos ler mais?
Ou, os livros podem nos salvar do que o meio digital faz com nosso cérebro?
Traduzido por Eduardo Rodrigues do original em:
https://medium.com/@hughmcguire/why-can-t-we-read-anymore-503c38c131fe
No
ano passado, li quatro livros.
As
razões para esse baixo número são, acho eu, as mesmas razões que
você teve para ler menos livros do que acha que deveria ter lido no
ano anterior: Tem sido cada vez mais difícil me concentrar em
palavras, frases, parágrafos. Muito menos em capítulos. Os
capítulos costumam ter página após página "cheinhas" de
parágrafos. É como se um espantoso número de palavras
concentrassem-se em si mesmas, sem que algo mais aconteça. E uma vez
terminado um capítulo, você tem que passar para outro. E,
geralmente, por mais um monte deles, antes que se possa dizer
terminado,
e chegar ao próximo. O próximo livro. A próxima coisa. A próxima
possibilidade. Próximo, próximo, próximo.
Eu sou um otimista
Ainda,
sou um otimista. Na maioria das noites do ano passado fui para a
cama com um livro - papel ou eletrônico - e comecei. Leitura. Leia.
Lendo. Uma palavra depois da próxima. Uma frase. Duas frases.
E
então ... Eu precisava de "alguma coisinha"
a mais. Algo para
me ajudar a continuar. Algo para aliviar aquela pequena coceira no
fundo da minha mente - apenas uma rápida olhada no e-mail do meu
iPhone; escrever e apagar uma resposta a um tweet engraçado de
William Gibson; encontrar, e seguir um link para um artigo bom,
realmente bom, no New
Yorker, ou melhor, a New York
Review of Books (que
eu poderia até ler a maior parte, se é tão bom assim). E-mail
novamente, só para ter certeza.
Os fumantes mais otimistas sobre sua capacidade de resistir à tentação são os mais propensos a recair quatro meses depois, e os dietistas super otimistas são os menos propensos a perderem peso. (Kelly McGonigal: O instinto da força de vontade)
Tenho
notado esse padrão de comportamento há algum tempo, mas acho que a
contagem de livros completos do ano passado nunca foi tão baixa antes. Desanimador, profundamente desanimador, pois minha vida
profissional gira em torno de livros:comecei no
LibriVox (audiobooks
de domínio público gratuito) e Pressbooks (uma
plataforma on-line para fazer impressão e e-books), e co-editei uma obra sobre o futuro dos livros.
Eu
dediquei minha vida, de um jeito ou de outro, aos
livros, acredito neles,
mas não consigo lê-los.
Quando o pessoal da New Yorker não consegue se concentrar o suficiente para ouvir uma música inteira, como os livros sobreviveriam?
Recentemente,
ouvi uma entrevista no podcast
da New Yorker,
o apresentador estava entrevistando o escritor e fotógrafo Teju
Cole.
Entrevistador:
Um dos desafios da cultura agora é, digamos, ouvir uma música inteira, estamos todos muito distraídos. Você ainda é capaz de dar uma profunda atenção às coisas, é capaz de se envolver em cultura dessa maneira?
Teju Cole:
Sim, com certeza.
Quando
ouvi isso, senti vontade de abraçar o entrevistador. Ele nem
conseguia escutar uma música completa antes de se distrair. Imagine
como deveria estar a sua pilha de livros de cabeceira.
Também
senti vontade de abraçar Teju Cole. São pessoas como o Sr. Cole que
nos dão esperança de que alguém permaneça capaz de ensinar aos nossos
filhos lerem livros.
Dançando para a distração
O
que era verdade com meus problemas em ler livros - o inevitável
canto da sereia da mega bomba digital de novas informações - também
valia para o resto da minha vida.
Minha
filha de dois anos dança em recitais. Tutu rosa. Orelhas de gato
presas na cabecinha dela. Juntamente com outras crianças de
dois anos de idade, diante de uma multidão de 75 pais e avós, essas
criancinhas fizeram um show. Já pode imaginar o resto. Você tem
visto esses vídeos no Youtube, talvez até eu tenha mostrado os
meus. O nível de fofura era extremo, um momento que define um
determinado tipo de orgulho paterno. Minha filha nem ao menos dançou,
ela apenas vagou pelo palco, olhando para a plateia com os olhos tão
arregalados quanto os olhos de uma criança de dois anos interagindo
com um bando de estranhos. Não importava que ela dançasse ou não,
eu estava tão orgulhoso. Tirei fotos, filmei usando o meu celular.
Frequentemente
me vejo nesse tipo de situação - checando e-mails, Twitter ou
Facebook - sem nada a ganhar, a não ser o estresse de uma mensagem
relacionada ao trabalho que, de qualquer maneira, não poderia mesmo
responder naquele momento.
Isso
me faz sentir vagamente indigno, consultando meu celular com minha
filha fazendo algo maravilhoso ao meu lado, como se eu estivesse
furtando sorrateiramente um cigarro.
Uma
vez eu estava lendo no celular enquanto minha filha mais velha, a de
quatro anos, tentava falar comigo. Não ouvi muito bem o que ela
havia dito, mas era um artigo sobre a Coréia
do Norte. Ela agarrou meu rosto com as duas mãos, puxou-me para ela.
"Olhe para mim" - ela disse - "quando estou falando com
você."
Socializando
com amigos ou familiares, muitas vezes sinto a vibração urgente
vinda daquela barra de aço inoxidável, vidro e metais raros no meu
bolso. Toque em
mim. Olha para mim. Você pode encontrar algo maravilhoso.
Essa
doença não se limita a quando estou tentando ler, ou durante os
eventos inesquecíveis com minha filha.
No
trabalho, minha concentração é constantemente quebrada: terminando
de escrever um artigo (este, na verdade), respondendo à solicitação
do cliente, revisando e comentando os novos designs, aprimorando a
cópia no Sobre a página. Estabelecendo contatos com isso e aquilo.
Impostos.
Todas
essas tarefas críticas para a minha subsistência são sobrepostas,
com mais frequência do que eu deveria admitir, por uma rápida
olhada no Twitter (para o trabalho), ou no Facebook (também para o
trabalho), ou um artigo sobre os
Conjuntos de Mandelbrot
(que,
neste minuto, eu li).
E-mail,
claro, é o pior, porque e-mail é onde o trabalho acontece, e mesmo
que não seja o trabalho
que você deveria fazer agora ,
pode ser uma tarefa mais fácil do que a atual, e
isso significa que você pode acabar trocando de atividade em vez de
continuar se concentrando no que estava fazendo até então. E só então voltar ao que
deveria ocupar a sua atenção integral.
Dopamina
e meio digital
Acontece
que os dispositivos digitais e os softwares são afinados para fazer
com que prestemos atenção neles, não importando o que mais
devêssemos estar fazendo. O mecanismo, corroborado por recentes
estudos neurocientíficos, é algo assim:
Nas
imagens por ressonância magnética é possível ver que os centros
de prazer do cérebro se iluminam (com atividade) quando novos
e-mails chegam.
Então,
cada novo e-mail recebido lhe proporciona uma pequena inundação de
dopamina. Cada pequena descarga da substância reforça na memória
que checar o e-mail gera uma nova enxurrada. E nossos
cérebros ficam programados para procurar coisas que nos darão
pequenas doses dessa dopamina. Além disso, esses padrões de
comportamento começam a criar caminhos neurais, para que se tornem
hábitos inconscientes: trabalhe em algo importante, coceira
cerebral, checar e-mail, dopamina,
atualização, dopamina,
checar o Twitter, dopamina,
voltar ao trabalho. Mais e mais, e a cada vez o hábito se torna mais
arraigado nas estruturas de nossos cérebros.
Como
os livros podem competir? (CONTINUA)
Gostou? Acha que poderia ser útil para mais alguém? Enriqueça suas redes sociais compartilhando num dos ícones abaixo (facebook, google + , twitter).
Then? Do you like it?
Share it!
Nenhum comentário:
Postar um comentário